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Déficit de mão-de-obra em tecnologia vira porta de inclusão para profissionais maduros

Déficit de mão-de-obra em tecnologia vira porta de inclusão para profissionais maduros

A chegada da maturidade, infelizmente, não é sinônimo de ápice profissional para uma grande parte dos brasileiros. Em vez de reconhecimento, profissionais dessa faixa etária se deparam com portas fechadas na hora de procurar emprego ou são deixados de lado nas promoções.

Mas a área de tecnologia, em que há um déficit gigante de mão de obra, encontrou nesse público uma forma de suprir a falta de profissionais.

“Apesar de ainda existir um estigma de que profissionais maduros não são aptos a lidar com tecnologia, as empresas começam a apostar neste público porque há demanda por mão-de-obra, mas também para aumentar a diversidade do quadro de funcionários”, afirma Mórris Litvak, fundador da Maturi, plataforma de empregos para profissionais com 50 anos ou mais.

Entre as empresas que decidiu apostar na formação de profissionais maduros na área de tecnologia está o Magazine Luiza. A varejista lançou neste mês o programa Desenvolve 40+, que oferece 100 vagas gratuitas para maiores de 40 anos terem uma formação em tecnologia.

“O Magalu tem um compromisso forte com ações de diversidade e inclusão. Nosso propósito é levar acesso ao que é privilégio de poucos. Quando olhamos para os profissionais de tecnologia, temos 14% com mais de 40 anos. E no mercado esse percentual não é maior. Por isso, queremos contribuir com a mudança desse cenário assim como já fizemos com outros públicos”, diz Caio Nalini, diretor de gestão de pessoas do Magalu.

Para participar do programa de formação em tecnologia 40+ não é necessário ter conhecimento prévio de tecnologia. O curso dura três meses, com 200 horas de aulas três vezes por semana.

Segundo Nalini, essa não é a primeira vez que o Magalu fez um profissional para profissionais maduros. A empresa fez antes um programa de atendimento para o público 50+. “Nosso ponto de vista não é se é novo ou velho. Identificamos a oportunidade de incluir essa população no universo da tecnologia. Hoje, eles são uma pequena parcela de profissionais nesse setor.”

De pós-doutoranda a dev

Faz pouquíssimo tempo que a desenvolvedora Valquíria Cruz, 45, trabalha na área de tecnologia. Com doutorado em engenharia de materiais, ela fazia pós-doutorado quando decidiu iniciar uma transição de carreira.

“Comecei a fazer vários cursos online em 2019. Em 2020, tive a oportunidade de me inscrever no Luiza Code [programa de tecnologia para mulheres]. Foi um mês de curso, todas as noites e sábados de manhã. Em novembro teve a formação, participei do processo seletivo e fui contratada em março deste ano”, conta a desenvolvedora júnior.

Ela diz que decidiu migrar de área porque se viu que as oportunidades profissionais estavam minguando e o mercado a considerava qualificada demais. “As portas foram se fechando, as oportunidades diminuindo. Não via perspectiva na minha área. Para continuar crescendo teria de sair do Brasil”, conta Valquíria, que já foi professora universitária.

O desejo por atuar na área de tecnologia veio depois dela ter contato com inteligência artificial na universidade. “Comecei a me identificar, vi que era uma área que estava crescendo bastante, resolvi tentar e ver no que ia dar.”

Mesmo tão qualificada, Valquíria diz pensou que a idade poderia ser um empecilho para a mudança de carreira. “Começar uma transição de carreira nessa idade dá um pouco de medo. Porque você está competindo com gente de 20 e poucos, que tem uma experiência diferente da sua. É difícil, mas não é impossível fazer essa transição.”

A desenvolvedora conta que está gostando muito da nova carreira. “É um desafio por dia, é tudo bem diferente do que vivi até hoje. Desde 1997, vivi o mundo da universidade. Comecei de novo, do zero, estou aprendendo muito.”

Valquíria Cruz foi contratada pelo Magalu após fazer o curso LuizaCode
Crédito: Arquivo Pessoal

Cenário ainda nublado

Apesar dessas iniciativas, o cenário ainda é desafiador para os profissionais com 40 anos ou mais. No ano passado, foram fechadas 729.015 vagas para profissionais de 40 anos para cima, segundo dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados). Dos 17 aos 39 anos, o saldo ficou positivo em 804.932 vagas.

De janeiro a setembro de 2021, o saldo de postos criados para os 40+ é de 205.981 vagas. Mas esse desempenho foi puxado pelos empregos das pessoas com 40 a 49 anos (266.214). Dos 50 anos para cima, foram cortadas 60.233 vagas.

“O cenário ainda é bem desafiador. Os 50+ foram os que mais perderam emprego na pandemia. A economia foi reabrindo, mas eles continuaram perdendo espaço, pois as empresas preferiram contratar pessoas mais jovens”, diz Mórris.

Segundo ele, a pandemia escancarou o preconceito contra os 50+. “Eles ficaram estigmatizados como frágeis ou não aptos para trabalhar em home office pela dificuldade de lidar com a tecnologia. O que não era fácil ficou ainda mais difícil.”

O fundador da Maturis diz que a busca por diversidade etária deve ajudar a incluir os 50+ no mercado. Mas os salários não são dos melhores. “Eles costumam receber menos, mas esse cenário está melhorando. As empresas estão deixando a visão assistencialista sobre esse público e percebendo que eles contribuem com experiência de vida, inteligência emocional.”

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